Passou pelo governo – e não foi abortada – uma tentativa de atingir o juiz, os promotores e os delegados da Lava Jato
As
tentativas do governo de obstruir as investigações da Operação
Lava-Jato não tiveram como alvo apenas os ministros do Supremo Tribunal
Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Para que o plano fosse
bem-sucedido, era necessário também frear o trabalho dos delegados, dos
procuradores do Paraná e do juiz Sergio Moro - os responsáveis pelo
processo que desvendou o maior escândalo de corrupção da história do
país, colocou na cadeia empreiteiros, políticos, lobistas e promove um
cerco ao ex-presidente Lula. A presidente Dilma, ao que tudo indica,
decidiu arriscar-se nesse terreno - e escalou para a missão o seu
assessor mais poderoso: o ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner.
Ele tem em mãos um dossiê que acusa o juiz Moro de participar de uma
conspiração com o objetivo de atingir o PT e seus líderes.
O documento, resultado de uma investigação paralela, foi entregue ao
ministro no fim do ano passado. Com o pomposo nome de "Relatório de
Inteligência", ele traz um organograma do que estaria por trás das
investigações da Lava-Jato. É um trabalho digno de "aloprados", como
Lula definiu em 2006 os petistas que compraram um dossiê fajuto para
tentar envolver o tucano José Serra, então candidato a governador de São
Paulo, numa quadrilha que desviava verbas do Ministério da Saúde. Na
época, a Polícia Federal desmontou a farsa e prendeu em flagrante a
arraia-miúda responsável pela falsificação, mas, de novo, os mandantes
conseguiram se safar. Desta vez, os mentores do plano têm nome e
sobrenome.
No fim do ano passado, Jaques Wagner recebeu em uma audiência no
Palácio do Planalto dois policiais federais ligados a sindicatos que
representam a categoria. A audiência não foi registrada na agenda do
ministro. O cuidado tinha explicação. Os agentes foram levar um dossiê
de seis páginas que acusa o juiz Moro, os procuradores, os delegados da
Operação Lava-Jato e até os advogados de réus que decidiram colaborar
com a Justiça de estarem todos a serviço de um grande plano do PSDB para
implodir o PT e o governo. Um diagrama com fotos anexado ao dossiê
tenta estabelecer essas conexões. O esquema mirabolante envolve na trama
até mesmo uma multinacional "interessada" em destruir a Petrobras. O
portador do documento foi o policial Flávio Werneck, presidente do
Sindicato dos Policiais Federais no Distrito Federal (Sindipol) e
vice-presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef). A
audiência foi acompanhada pelo também petista Tião Viana, governador do
Acre.
Procurado por VEJA, Werneck admitiu que levou o dossiê ao ministro.
Ele explicou que apresentou o caso ao Planalto por se tratar de uma
denúncia grave, num momento delicado pelo qual passa o país. "Temos um
problema de anacronismo na investigação, que já tem dois anos e vem
pegando pontos-chave de empresas e do governo. Isso afeta diretamente a
economia", explicou o agente. Jaques Wagner, depois de ler o conteúdo,
teria dito apenas que encaminharia o dossiê para "um promotor baiano de
sua confiança dar sequência ao assunto". Os sindicalistas aproveitaram a
reunião para pedir reajuste salarial e repisar outras reivindicações da
categoria - reivindicações que o ministro se comprometeu a atender.
O envolvimento do chefe da Casa Civil numa operação desastrada para
obstruir as investigações é mais uma grande dor de cabeça para o
governo. Na semana passada, Jaques Wagner recebeu da presidente Dilma
Rousseff carta branca para escolher o substituto de José Eduardo Cardozo
no Ministério da Justiça, pasta à qual está subordinada
hierarquicamente a Polícia Federal. O eleito de Wagner para a vaga foi o
promotor baiano Wellington Lima e Silva, até então uma figura
desconhecida nacionalmente, mas famosa na Bahia por uma longa folha
corrida de serviços prestados ao PT e ao hoje ministro da Casa Civil. A
troca acontece no momento em que as investigações apontam para conexões
do escândalo na Bahia. A polícia colheu indícios de que dinheiro
desviado do petrolão pode ter financiado em 2014 a campanha do petista
Rui Costa, sucessor de Wagner no governo. Uma nota fiscal apreendida
revelou um repasse de 255 000 reais da OAS, uma das empreiteiras
envolvidas no escândalo, para a empresa Pepper Comunicação. Os
investigadores já sabem que houve uma simulação de prestação de serviço.
O dinheiro, na verdade, teria sido remetido clandestinamente para
saldar dívidas da campanha do PT na Bahia. A substituição de Cardozo
também chamou atenção por ter acontecido às vésperas da ação da
Lava-Jato contra o ex-presidente Lula, de quem Wagner é um fiel
escudeiro.
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