O homem mais rico do Brasil acha que o problema do país é a “desigualdade”. Aparentemente, ele quer dividir a riqueza dos outros.
A fortuna pessoal de Jorge Paulo Lemann é estimada, segundo a Forbes,
em R$ 100.000.000.000,00. Você leu direito, é o número 1 seguido de 11
zeros. Cem bilhões de reais ou cem mil milhões, como diriam nossos
amigos portugueses.
É tanto dinheiro que facilmente perdemos o senso de proporção. Para
facilitar: 100 bilhões de reais corresponde a 1 milhão multiplicado por
100 mil. Lemann poderia dividir seu patrimônio e criar cem mil
milionários numa canetada. Ou poderia dar cem mil reais para um milhão
de brasileiros, você escolhe. Mas a matéria da Folha sugere que ele
acredita em dividir o dinheiro dos outros.
Li “Sonho Grande”, o livro de Cristiane Correa sobre dos “capitalistas
brasileiros” que “conquistaram o mundo”. Lemann parece que precisa reler
o livro e lembrar que ele acumulou sua fortuna por conta de uma
inteligência acima da média, trabalho duro e uma ambição sem
limites. Agora que venceu, quer melar o jogo para os pobres mortais que,
na visão de muitos ricos, não nasceram com os mesmos superpoderes? Se
ele realmente pensa isso, está enganado.
Desigualdade é o que representa o patrimônio de Jorge Paulo Lemann em
relação ao resto dos brasileiros e não há qualquer problema nisso, ao
menos para quem não teve o cérebro corroído por departamentos de humanas
das universidades ocidentais. O problema é a falta de mobilidade
social.
É claro que Lemann teve um início de vida diferenciado, com suas
partidas de tênis no Country Club de Ipanema e sua formação em Harvard.
Mas esta é a história de todos os bilionários da lista da Forbes? Uma
olhada na lista mostrará que não.
O primeiro da lista, Bill Gates, é um empreendedor que largou Harvard
para mergulhar no próprio negócio, mesmo tendo entrado na mais
prestigiosa faculdade do mundo com 1590 pontos em 1600 possíveis no SAT,
uma espécie de ENEM americano. Gates era de classe média alta mas é
claro que sua fortuna vem do seu gênio e da sua obstinação pelo
trabalho, além de estar no lugar certo e no momento certo da ascensão
dos computadores nos EUA da era Reagan.
O segundo da lista, o espanhol Amancio Ortega, dono da Zara, é filho
de ferroviário e começou a vida profissional aos 14 anos quando largou a
escola e foi trabalhar como costureiro numa pequena loja. Ortega tem
mais que o dobro do dinheiro de Lemann.
Seguem na lista Warren Buffett, Carlos Slim, Jeff Bezos, Mark
Zuckerberg, Larry Ellison, Michael Bloomberg e os irmãos Koch. Algum
sultão, rei ou herdeiro de um conglomerado? Nenhum. E aí está a beleza
única do capitalismo.
A lista dos mais ricos da Forbes começou em 1987 e eu recomendo que
você dê uma olhada nela antes de formar uma opinião definitiva sobre o
assunto. Você verá que os ricos de 30 anos atrás, bem como seus
herdeiros, praticamente não são encontrados na lista atual. A riqueza,
no livre mercado, é móvel.
Colocar governos para arbitrar quem pode ou não pode ter dinheiro já
foi tentado e nunca deu certo ou dará. Simplesmente não funciona e
arbitrariedade, quando substituta do mérito, acaba por empobrecer quem
finge querer ajudar.
O que faz o crescimento econômico e o desenvolvimento é a livre
alocação de recursos por seus proprietários, que apostam seu próprio
patrimônio no mercado na tentativa de multiplicar o investimento. Seu
sucesso depende da aceitação do consumidor que livremente premiará seu
talento, trabalho duro e criatividade com dinheiro, numa troca em que
ambos saem ganhando.
Quando governos saem da economia, o espírito empreendedor da
população floresce e os caminhos para a mobilidade social se abrem. Nos
países em que os burocratas, a elite culpada, os intelectuais e os
artistas resolvem decidir em nome do povo onde o dinheiro do país deve
ser gasto, o resultado é miséria, corrupção e, claro, mais
“desigualdade” entre a elite e o população.
Ricos, assim como artistas e acadêmicos, devem ser reconhecidos pelo
que conquistaram e pelo que sabem fazer, não necessariamente por suas
idéias políticas e seu código moral e ético, não raro totalmente
distintos do resto da população. Especialmente quando sua principal
proposta é filantropia com o dinheiro alheio.
A solidariedade humana reside na moral e não na economia. O homem
mais rico da lista da Forbes é também o fundador da Bill & Melinda
Gates Foundation, a maior instituição de caridade do mundo, e seu maior
doador é, além do próprio Bill Gates, Warren Buffet. Isto deveria
sugerir algo ao brasileiro que aparece na 19a posição.
Deve haver um ótimo motivo para Lemann não dividir hoje mesmo seu
patrimônio. O que não fica bem é ele achar que o problema do mundo é o
patrimônio dos outros.
– [Update] Leitores mencionaram os investimentos filantrópicos de
Lemann: a fundação que leva seu nome e a Fundação Estudar (80% do
investimento não é dele, diga-se), iniciativas positivas mas que em nada
mudam o ponto central do texto: a desigualdade não é o problema mas a
falta de mobilidade social causada, em grande parte, pela falta de
liberdade econômica.
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