'É uma ilusão achar que o status de ministério confere prestígio especial à pasta', resume o economista Gil Castello Branco
Após
a extinção do Ministério da Cultura pelo governo do presidente interino
Michel Temer seguiu-se uma verdadeira grita da classe artística.
Antigas instalações da pasta foram ocupadas ao redor do país, numa
manifestação que cruzou a fronteira nacional para chegar ao tapete
vermelho do Festival de Cinema de Cannes, na França, quando atores
brasileiros classificaram o impeachment da presidente Dilma Rousseff
como um "golpe". Mas se de fato a preocupação com a pasta fosse genuína,
o barulho deveria ter começado ainda na gestão da presidente afastada
Dilma Rousseff - e de seu antecessor no cargo: de 2003 até agora, quase
metade dos recursos previstos para ser injetados na Cultura ficou na
gaveta, segundo levantamento no Sistema Integrado de Administração
Financeira (Siafi) obtido pelo site de VEJA.
"O Ministério da Cultura estava claramente em um processo de
esvaziamento e sendo asfixiado", afirmou o novo titular da pasta,
Mendonça Filho, ao site de VEJA. Segundo ele, há um compromisso de,
diante da baixa destinação deste ano, aumentar a destinação prevista
para o setor no ano que vem.
A demonstração mais evidente das tesouradas das gestões petistas na
pasta está nos cortes sucessivos conduzidos pela presidente Dilma
Rousseff: em 2013 o governo reservou 4,2 bilhões de reais (em valores
corrigidos pela inflação) do Orçamento para o setor, mas o dinheiro para
a Cultura foi diminuindo a cada ano e, em 2016, chegou ao menor patamar
desde o primeiro mandato da presidente afastada: 2,4 bilhões de reais,
em valores também corrigidos.
Nos treze anos dos governos Lula e Dilma, foram autorizados 26,1
bilhões de reais para o setor - o equivalente a 36 bilhões de reais em
valores atualizados. No entanto, apenas 13,7 bilhões de reais, ou 19,2
bilhões nos valores atuais, foram efetivamente pagos. Ou seja, 53% do
orçamento total, por algum motivo, acabou não sendo aplicado.
De acordo com o economista Gil Castello Branco, diretor da ONG Contas
Abertas, há alguns fatores que justificam a diferença entre o valor
previsto e o efetivamente pago, como contingenciamentos, cortes nas
emendas parlamentares e a má gestão, quando há recursos, mas não
projetos específicos para o investimento. "É praticamente impossível, em
uma estrutura de 39 ministérios, haver uma atenção diferenciada para
cada ministro. É uma ilusão achar que o status de ministério confere
prestígio especial à pasta. Nós nos acostumamos com uma anomalia, que é o
país ter 39 ministérios. Quando diminui para 23, isso torna-se um
escândalo", afirma o economista. Ele pondera que a redução da estrutura
tem importância maior para dar racionalidade e funcionalidade à maquina
pública do que para reduzir, de fato, as despesas que na maioria são
obrigatórias.
Dados do Contas Abertas ainda dão um panorama mais aprofundado sobre o
Ministério da Cultura: a pasta, até este mês, abrigou 922 servidores -
430 deles exercendo cargos de Direção e Assessoramento Superior (DAS).
As remunerações com o DAS vão de 2.200 a 14.000 reais. O levantamento
também traça o direcionamento das verbas do ministério até abril deste
ano. Chama atenção o fato de que apenas 54% dos recursos tenham sido
reservados para a atividade fim, que é o desenvolvimento da cultura. O
restante dos gastos esteve relacionado, na maior parte, a questões de
gestão, como a manutenção do ministério, reserva de contingência e
pagamento de previdência.
Do orçamento diretamente previsto para o setor, 40% das dotações
autorizadas são destinadas ao Fundo Setorial do Audiovisual - o que
explica o temor de tantos diretores e artistas conhecidos de perderem o
aporte. Já para a promoção e fomento à cultura brasileira, o
investimento foi de apenas 9% do total empenhado.
Por: Marcela Mattos, de Brasília
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