Dos 7,7 milhões de candidatos participantes do
exame em 2015, mais de 53.000 tiraram nota zero na redação e apenas 104
tiraram 1.000, a pontuação máxima que um estudante pode obter
(Arquivo/VEJA/VEJA)
No Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) a nota da redação
representa 20% do resultado final do candidato. Para avaliar as
habilidades de escrita dos estudantes, a banca examinadora costuma
selecionar temas atuais, discutidos no noticiário nacional ao longo do
ano em que a prova foi elaborada.
“Os assuntos que aparecem nas redações são, normalmente, questões
importantes que afetam a sociedade brasileira”, explica Gisele Lemos,
professora de redação do Curso Poliedro. “Por isso é bom ficar atento a
leis, determinações ou modificações sociais que atinjam grupos
específicos.”
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Para a professora, um caso exemplar foi o do Enem do ano passado, que
teve como tema “a persistência da violência contra a mulher na
sociedade brasileira”. Em março de 2015, havia sido sancionada uma lei
que incluiu na lista de crimes hediondos (grupo de crimes tratados de
forma mais severa, como o estupro e o genocídio) os casos de mulheres
que foram assassinadas justamente pelo fato de serem mulheres. Antes
desse dispositivo, chamada Lei do Feminicídio, a única lei especifica
para agressão contra mulher era a Lei Maria da Penha, de 2006.
Ao abordar o tema, o Enem avalia cinco competências que, reunidas,
vão compor a nota total da redação: domínio da norma culta, compreensão
da proposta e escrita de um texto dissertativo, defesa de um ponto de
vista com bons argumentos, conhecimento dos mecanismos linguísticos, e
elaboração de uma proposta de intervenção para o problema em questão.
Dos 7,7 milhões de candidatos participantes do exame em 2015, mais de
53.000 tiraram nota zero na redação e apenas 104 tiraram 1.000, a
pontuação máxima que um estudante pode obter. “Alguns alunos perderam
ponto ou tiveram a nota zerada porque apresentaram argumentos que ferem
os direitos humanos”, disse Gisele.
Evolução
Ao longo dos anos, a prova de redação do Enem
passou de temas mais abstratos, como o primeiro, de 1998, “viver e
aprender”, até chegar a propostas bastante específicas a partir de 2000.
“Com o tema ‘direitos da criança e do adolescente: como enfrentar
esse desafio nacional?’, em 2000, ficou evidente a preocupação do Enem
com o papel social do candidato e seu interesse por questões
fundamentais para a população brasileira”, afirma a professora. Naquele
ano, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completava 10 anos.
Sobre o Enem 2016, Gisele acredita que o exame deve seguir o modelo
de problematizar questões ligadas a minorias sociais. “O tema deve focar
algum dos grupos que ainda não tem direitos específicos assegurados por
lei”, diz. O conselho da professora é que os candidatos fiquem atentos a
mudanças nas leis brasileiras, ao noticiário e até a dados e estudos
divulgados neste ano, principalmente pela Organização das Nações Unidas
(ONU).
Espelho
Em junho deste ano, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (Inep) liberou a consulta do espelho de
redação de 2015. Através desse documento o aluno pode conferir como foi
seu desempenho em cada uma das habilidades exigidas. A primeira vez que o
candidato teve acesso ao espelho foi no Enem 2012. Naquele ano, os
casos de textos que tinham a receita de como cozinhar macarrão ou o hino
do time de futebol Palmeiras questionaram os critérios de avaliação da
banca examinadora. O tema era “O movimento imigratório para o Brasil no
século XXI”.
Confira todos os temas de redação na história do Enem:
-
1. 2015: A persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira
(Dario Oliveira/Futura Press/Folhapress)
O tema exigia do candidato
uma reflexão sobre os impactos na sociedade da persistência da
violência contra as mulheres brasileiras. Diferente dos outros anos,
segundo professores, o assunto só poderia ter um tipo de posicionamento:
os argumentos deveriam ser contrários à violência. Em 2015, a Lei do
Feminícidio foi sancionada e incluiu o assassinato de mulheres, motivado
pela condição da vítima ser do sexo feminino, na lista de crimes
hediondos (grupo de crimes tratados pela lei de forma mais severa, como o
estupro e o genocídio).
-
2. 2014: Publicidade infantil em questão no Brasil
(/Thinkstock)
Para redigir o texto, os
candidatos deveriam abordar o limite entre os direitos de crianças e
adolescentes e a liberdade de expressão dos publicitários. Para a
professora de redação Gisele Lemos, do Curso Poliedro, o tema foi
inesperado. “Um dos problemas deste ano foi a correta interpretação do
que a redação exigia”, afirma.
Naquele ano, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do
Adolescente (Conanda) publicou no Diário Oficial da União uma resolução
considerando abusiva a publicidade voltada a crianças e adolescentes. O
Código de Defesa do Consumidor brasileiro proíbe a publicidade abusiva
direcionada à criança desde 1990.
-
3. 2013: Efeitos da implantação da Lei Seca no Brasil
(Julia Chequer/Folhapress)
Sancionada em 2008, a Lei
Seca tornou-se mais rígida no final de 2012. Partir de então passou a
permitir a prisão do motorista no caso do bafômetro apontar mais de 0,34
miligramas de álcool por litro de ar.
-
4. 2012: O movimento imigratório para o Brasil no século XXI
(Nelson Antoine/FramePhoto)
A proposta exigia do
candidato uma reflexão sobre o aumento do fluxo de imigrantes no Brasil.
Segundo o Ministério da Justiça, em junho de 2011, o Brasil tinha 1,46
milhão de imigrantes em situação regular – um aumento de 52,4% em
relação a dezembro de 2010, que contabilizava 961.877 estrangeiros. Os
novos moradores eram principalmente do Haiti (país devastado por um
terremoto em 2010), Peru e Bolívia. Os imigrantes buscavam melhores
condições de vida e oportunidades de emprego.
-
5. 2011: Viver em rede no século XXI: os limites entre o público e o privado
(/VEJA)
A convivência social na
internet foi o tema da redação. “Uma das maneiras de abordar o tema
poderia ser fazendo uma avaliação do impacto das redes sociais nas
relações humanas”, afirma Gisele. Em 2011, a rede social Twitter liberou
o sistema no qual os brasileiros podiam ajudar na tradução para o
português do conteúdo do site. Além disso, em junho daquele ano, a
Organização das Nações Unidas (ONU) afirmou que o acesso à internet era
um direito humano, assim como educação e segurança.
-
6. 2010: O trabalho na construção da dignidade humana
(Agência Estado)
Em 2010, um dos textos de
apoio falava sobre trabalho escravo, observando que a prática não
terminou com a assinatura da Lei Áurea, em 1888. Já outro texto
apresentava uma previsão de como será o trabalho no futuro. Segundo
Gisele Lemos, professora de redação do Curso Poliedro, a proposta,
bastante ampla, pedia para discutir as leis trabalhistas no Brasil.
-
7. 2009: O indivíduo frente à ética nacional
(Pedro Ladeira/FramePhoto)
Em 2009, houve uma grande
reformulação para transformar o Enem em um processo seletivo para várias
universidades brasileiras. A partir de então, o exame passou a ser
realizado em dois dias, com um total de 180 questões de múltipla
escolha, mais a prova de redação. O tema da redação que marcou a mudança
foi o embate entre a ética no cotidiano de cada indivíduo e a
corrupção.
“A discussão do mensalão, descoberto em 2005, ainda era muito presente
no noticiário brasileiro”, afirma Gisele Lemos, professora de redação do
Curso Poliedro. Os alunos poderiam, então, discutir a ética particular
em contraste com a ética pública. Mensalão foi o nome dado ao esquema
ilegal de financiamento político, ocorrido entre 2003 e 2004.
-
8. 2008: Como preservar a floresta Amazônica?
(Paulo Whitaker/Reuters)
O tema levava o candidato a
refletir sobre o ambiente, oferecendo três pontos de vista que
serviriam como base de argumentação. O primeiro pregava a suspensão
imediata do desmatamento; o segundo defendia incentivos financeiros a
proprietários que parassem de desmatar; o terceiro previa o aumento da
fiscalização. Para a professora de redação Gisele Lemos, do Curso
Poliedro, o tema também recordava a morte do ativista Chico Mendes. O
ano de 2008 marcou o aniversário de vinte anos do assassinato do
ativista. O sindicalista e ambientalista brasileiro lutou a favor dos
seringueiros da Bacia Amazônica, cuja existência dependia da preservação
da floresta e das seringueiras nativas. “Para mim, um dos temas mais
difíceis”, afirma Gisele.
-
9. 2007: O desafio de se conviver com as diferenças
(Lefteris Pitarakis/AP)
Em 2007, a proposta era
discutir a convivência com diferentes culturas. Segundo Gisele, o
candidato poderia abordar argumentos que mostrassem como respeitar o
próximo, independente da sua religião ou nacionalidade. “O tema também
pode ser associado à morte do brasileiro Jean Charles, que havia
ocorrido dois anos atrás, em Londres”, afirma a professora. O brasileiro
foi assassinado pela Polícia de Londres, após ser confundido com um
terrorista.
-
10. 2006: O poder de transformação da leitura
(Peter Macdiarmid/Getty Images)
O objetivo era verificar
de que forma o candidato expressava suas experiências de vida e
transformava o passado em aprendizado para o futuro. A escolha do tema
foi associada ao aniversário de dez anos da terceira versão da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação (LDB). A LDB define e regulariza o
sistema educacional brasileiro.
-
11. 2005: O trabalho infantil na sociedade brasileira
(Wilson Dias/Agência Brasil)
O assunto escolhido exigia
dos candidatos não só uma postura crítica em relação ao assunto, mas
também propostas de solução do problema que pudessem ser organizadas
pela população — e não só pelo governo.
“Neste tema o candidato poderia citar o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA)”, afirma a professora de redação do Curso Poliedro,
Gisele Lemos.
-
12. 2004: Como garantir a liberdade de informação e evitar abusos nos meios de comunicação?
(Wael Hamzeh/EFE)
Neste ano, os textos de
apoio apresentavam dados sobre programas sensacionalistas da TV e as
consequências de uma possível fiscalização da imprensa. Em setembro de
2003, supostos integrantes da facção criminosa Primeiro Comando da
Capital (PCC) deram uma entrevista ao programa 'Domingo Legal', do canal
SBT. No final daquele mês, a Polícia Federal descobriu que a entrevista
era uma farsa. O programa foi acusado pelo Ministério Público Federal
de abuso da liberdade de imprensa e de ferir a ética ao dar voz ao
crime.
-
13. 2003: A violência na sociedade brasileira: como mudar as regras desse jogo?
(Christophe Simon/AFP)
No Enem 2003, a redação
exigia do candidato uma reflexão sobre a violência no Brasil, colocando
textos de apoio que mostravam a desigualdade social e o ciclo de
violência. Pela primeira vez, a proposta de redação apresentava
estatísticas. “Associo a escolha do tema a dois momentos marcantes na
história do Brasil: a morte do jornalista Tim Lopes e o lançamento do
filme 'Cidade de Deus'”, afirma a professora de redação Gisele Lemos, do
Curso Poliedro.
Em julho de 2002, a polícia encontrou os ossos de Tim Lopes em um
cemitério clandestino em uma comunidade do Rio de Janeiro, depois de um
mês desaparecido. Lopes era repórter investigativo e fazia denúncias
constantes sobre o tráfico de drogas e abuso de crianças e adolescentes
em favelas cariocas. Sete bandidos foram presos acusados de sequestrar,
torturar e matar Tim Lopes.
Já o filme 'Cidade de Deus', do cineasta Fernando Meirelles, retrata o
crime organizado na comunidade Cidade de Deus, no Rio de Janeiro. O
longa metragem estreou em agosto de 2002 e recebeu quatro indicações ao
Oscar.
-
14. 2002: O direito de votar: como fazer dessa conquista um meio para promover as transformações sociais que o Brasil necessita?
(Agência Estado/VEJA)
A proposta de redação
trazia textos que falavam sobre a democracia, luta social pelo direito
de voto e a importância de escolher bem os representantes políticos. “O
tema pode ser relacionado ao resultado das eleições para presidente
daquele ano”, afirma a professora de redação do Curso Poliedro, Gisele
Lemos. Após oito anos de governo de Fernando Henrique Cardoso, do
Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), Luís Inácio Lula da
Silva, do Partido do Trabalhadores (PT), chegou à Presidência da
República, alterando a configuração da política no país.
-
15. 2001: Desenvolvimento e preservação ambiental: como conciliar os interesses em conflito?
(Danilo Valentini/VEJA)
O tema tratava da
interação do homem com a natureza. Em 2001, os Estados Unidos ficaram
fora das negociações sobre o Protocolo de Quioto. O presidente na época
era George W. Bush, que alegou que a permanência do país no acordo
poderia prejudicar a economia americana. O Protocolo é um tratado
internacional com compromissos de redução da emissão de gases que
agravam o efeito estufa e foi criado em 1997.
-
16. 2000: Direitos da criança e do adolescente: como enfrentar esse desafio nacional?
(/VEJA)
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O candidato deveria
analisar a discriminação e a exploração que algumas crianças sofrem,
fazendo um contraponto com os direitos e deveres garantidos por lei.
Naquele ano o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completava 10
anos de sua criação. O ECA regulamenta os direitos das crianças e jovens
no Brasil.
-
17. 1999: Cidadania e participação social
(Gabriela Batista/VEJA)
Nesta proposta, o
candidato poderia usar argumentos que mostrassem que o futuro do país
estava ligado à participação ativa dos jovens. “A banca examinadora
gostaria de observar de que maneira o candidato participava da
sociedade”, afirma Gisele. “Ser cidadão não é só conhecer os seus
direitos. É participar, ser dinâmico”, dizia um dos textos de apoio.
-
18. 1998: Viver e aprender
(/Thinkstock)
O tema que incentivava
reflexões sobre a vida foi o assunto da redação na primeira edição do
Enem. A proposta trazia um trecho da letra da música “O que é, o que é?”
do artista brasileiro Gonzaguinha. Para a professora do Curso Poliedro,
Gisele Lemos, uma noticia da época que poderia estar ligada à redação
era a publicação da clonagem do primeiro mamífero, a ovelha Dolly, em
1997, que colocou em questão o significado da vida e as possibilidades
de humanos criarem outros seres vivos.
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