Delator afirma que Renan recebeu propina de fornecedoras da Transpetro (Ilustração: Época / Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom)
Depoimentos sigilosos do carregador das malas de propina para
senadores do PMDB, Felipe Parente, narram em detalhes o trajeto dos
pagamentos de R$ 5,5 milhões de propina de empreiteiras ao presidente do
Senado Renan Calheiros (PMDB) e ao seu grupo político. O nível de
minúcias da mais recente delação vazada à imprensa já é considerado
capaz de reunir um conjunto de provas mais robusto contra Renan,
praticamente ainda intocado pelo maior cerco à corrupção da História do
Brasil.
De acordo com o delator, o montante da propina destinada ao núcleo do
senador alagoano que resiste ao cerco da Operação Lava Jato atinge R$
11 milhões em valores atualizados e era entregue, quase sempre, no
restaurante Chez Pierre, no anexo do Hotel Ipanema Plaza, na Zona Sul do
Rio de Janeiro. De acordo com o volume da remessa, que variava entre R$
250 mil e R$ 1 milhão, o dinheiro sujo vinha dentro de envelopes,
sacolas e até malas.
A origem dos recursos seriam contratos com a Queiroz Galvão e UTC e a
empresa de afretamento de navios Teekay Norway, repassados entre 2004 e
2006 a Renan e ao senador Jader Barbalho (PMDB-PA).
Por meio de uma senha, o homem da mala dos senadores do PMDB fazia a
entrega a Iara Jonas, 64, assessora do Senado com descrita como mulher
elegante e distinta, que não conversava além do necessário para cumprir o
seu papel: pegar o dinheiro. Foram cerca de 15 encontros com o objetivo
criminoso, segundo o delator, com a responsável pelo delivery exclusivo
de propinas endereçadas a Renan e a Barbalho, que lotava Iara em seu
gabinete.
Vácuo preenchido
Os depoimentos sigilosos de Parente foram prestados aos procuradores
do Grupo de Trabalho da Lava Jato na Procuradoria-Geral da República. E
publicados nas duas principais revistas semanais do Brasil nesta
sexta-feira (21), Veja e Época.
A exatidão dos endereços e circunstâncias do roteiro narrado por
Parente em primeira pessoa expõe o fluxo da propina, desde as captações
junto a empreiteiras do petrolão até as mãos da assessora Iara. As novas
informações ocupam o vácuo de delações como as de Sérgio Machado e seus
filhos Daniel, Expedito e Sérgio, dando materialidade às afirmações
sobre o loteamento da Transpetro entre senadores do PMDB e fortalecendo o
cerco da Procuradoria Geral da República (PGR) ao presidente do Senado.
O delator é um empresário cearense ligado ao então diretor da
Transpetro, Sérgio Machado. Ele também era uma espécie de arrecadador da
propina destinada ao PMDB junto a empresários com contratos vigentes na
estatal.
Parente narra que o presidente do Senado seria o principal
beneficiário das propinas, já que era o padrinho de Machado na
Transpetro. A confissão do homem da mala do PMDB fornece a prova mais
robusta até agora, no petrolão, contra Renan.
Parente recebia 5% do valor que transportava entre empreiteiras e
intermediários de políticos. O delator disse que usou como senha a
palavra “lua” quando tratou diretamente com o então presidente da
Queiroz Galvão, Idelfonso Colares, sobre o desembolso de R$ 3,5 milhões
em espécie da empresa para abastecer os cofres de Renan Calheiros e
Jader Barbalho.
A logística era semelhante no caso do R$ 1 milhão em propina paga
pela UTC, cujo então presidente Ricardo Pessôa comandava a contabilidade
do clube de empresas do propinoduto do petrolão. Da UTC, foram R$ 500
mil divididos entre Renan e Jader Barbalho, pagos entre o segundo
semestre de 2005 e o início de 2006. E os R$ 500 mil restantes teriam
como destinatário Daniel Machado, filho do diretor da Transpetro.
Parente relata que outro R$ 1 milhão em propina foi pago pela Teekay
Norway em nome de Renan e Jader Barbalho, no segundo semestre de 2004.
Veja trechos dos depoimentos de Felipe Parente:
“Que os repasses da Queiroz iniciaram em 2004 e perduraram até
2006; que Sérgio Machado chamou o depoente até a sede da Transpetro e
pediu que o depoente fosse até a sede da Queiroz para receber valores
que seriam destinados aos senadores Renan Calheiros e Jader Barbalho;
Que o depoente foi até a sede da Queiroz, foi recebido pelo Sr.
Ildefonso, que lhe orientou a ir até a Rua da Quitanda, nºs 50 a 80,
numa determinada sala e dissesse a senha Lua”
“Que o depoente levou a sacola com dinheiro para o flat [no
Leblon ou no Ipanema Plaza]; que depois Iara entrou em contato com o
depoente; que foram mais ou menos dez repasses da Queiroz para os
senadores Jader e Renan; que, em todas as dez vezes, foi Iara que
recebeu os recursos destinados tanto ao senador Jader, quanto ao senador
Renan”.
“Que todas as vezes que o depoente intermediou recursos
destinados ao senador Renan Calheiros foi Iara quem se apresentou para
receber tais valores; que nunca foi procurado por outra pessoa ligada ao
senador Renan Calheiros”.
“Que, depois do depoente receber a segunda parcela do Sr. Tobias,
uma mulher ligou para o depoente e disse que estava ligando para
receber os recursos do senador Renan; que quando esta pessoa foi até o
flat do depoente, este identificou que se tratava da mesma Iara que fora
receber os recursos destinados ao senador Jader; que Iara também desta
vez subiu até o quarto do depoente num flat, salvo engano, no Leblon;
que o depoente questionou Iara, mas ela disse que era isso mesmo, que se
tratava do mesmo assunto; que o depoente informou então a Sérgio
Machado dobre o ocorrido e ele disse que era isso mesmo”.
Outro lado
Aos repórteres Filipe Coutinho e Ana Clara Costa, da Revista Época, o
senador Jader Barbalho negou conhecer Felipe Parente e ter recebido
repasses originados de tais empresas por intermédio dele. Renan
Calheiros disse não conhecer Parente nem ter relação alguma com Iara
Jonas, apesar de saber quem é. E disse ainda que “jamais, em nenhuma
circunstância, recebeu vantagens de quem quer que seja”. A Época também
tentou ouvir Iara Jonas, sem sucesso.
À época da delação de Sérgio Machado, a Construtora Queiroz Galvão disse não comentar investigações em andamento.
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