Ex-ministro petista é suspeito de ter atuado junto a banco estatal para favorecer grupo frigorífico num investimento de 3,5 bilhões de reais
O ex-ministro Antonio Palocci, preso há dois meses em
Curitiba na Operação Lava-Jato, está na mira de outra complexa
investigação em Brasília. O petista é suspeito de ter ajudado o grupo
frigorífico JBS a receber um investimento bilionário do BNDES.
Instaurado a pedido do Ministério Público Federal, o inquérito sigiloso,
obtido por VEJA, é conduzido pela Polícia Federal.
O objetivo da investigação é “apurar prática de atos de
improbidade administrativa por parte de dirigentes do BNDES em razão dos
investimentos, possivelmente fraudulentos, realizados nas empresas
Bertin e JBS, bem como eventual participação de Antonio Palocci Filho
com fins de beneficiar a empresa JBS”, segundo documento do MPF.
Com bom trânsito entre grandes empresários do país, Palocci tinha uma
extensa lista de clientes, dos mais variados setores – de banqueiros a
dono de rede de supermercados e hospitais. Entre as companhias que
recorreram aos serviços de consultor do ex-ministro da Casa Civil está a
JBS. De 2009 a 2010, a dona da marca de carnes Friboi pagou 2 milhões
de reais para a Projeto Consultoria Empresarial e Financeira, de
Palocci.
Oficialmente, o médico sanitarista assessorou o grupo frigorífico com
análises das “perspectivas do mercado de carnes de frango” nos Estados
Unidos. No mesmo período, a JBS recebeu um investimento de 3,5 bilhões
de reais do BNDES. Os investigadores suspeitam que Palocci esteja por
trás dessa operação financeira que apresenta indícios de fraudes.
O ex-ministro alega que ajudou a JBS na aquisição da produtora de
frango americana Pilgrim’s, em setembro de 2009. No entanto, as
negociações dessa transação começaram no segundo semestre de 2008 – e
foram conduzidas por grandes escritórios de advocacia e bancos de
investimento, especializados em fusões e aquisições.
Palocci, então deputado federal pelo PT, foi contrato pelo grupo
frigorífico em julho de 2009, pouco antes da transação ser finalizada.
No mesmo período em que comprou a Pilgrim’s, a JBS também anunciou a
aquisição do grupo Bertin, parceiro de negócios do pecuarista José
Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Lula.
O aporte do banco estatal na JBS foi um negócio e tanto. O BNDES
comprou 3,5 bilhões de reais em títulos de dívida emitidos pela empresa,
chamados de debêntures. Esses papéis foram convertidos em ações da
companhia. A transação foi vantajosa para o grupo frigorífico, que não
teve que arcar com juros de um empréstimo normal – e ainda ganhou o
governo como sócio. O Tribunal de Contas da União já identificou
indícios de que essa operação causou prejuízo aos cofres públicos. O
caso está sendo analisado.
Em 2010, após receber os recursos do BNDES, a JBS doou 10 milhões de
reais para a campanha que elegeu Dilma Rousseff à presidência da
República. A vitória da petista nas urnas foi coordenada por Palocci,
que logo em seguida foi nomeado como ministro da Casa Civil, em janeiro
de 2011. Seis meses depois, o petista caiu após o jornal Folha de S.Paulo revelar que ele multiplicara o seu patrimônio prestando consultorias para diversas empresas.
Em setembro deste ano, Palocci foi preso na 35ª fase da Operação
Lava-Jato, suspeito de ter uma relação criminosa com a empreiteira
Odebrecht, que teria desembolsado mais de 128 milhões de reais em
propinas para o ex-ministro e outros integrantes do PT. De acordo com a
Polícia Federal, Palocci ajudou a construtora a destravar, por exemplo,
um empréstimo do BNDES para desenvolver projetos em Angola. No início
deste mês, o ex-ministro sentou pela primeira vez no banco dos réus,
acusado pelo Ministério Público Federal de ter praticado os crimes de
corrupção e lavagem de dinheiro.
Procurado, o advogado José Roberto Batochio, que defende Palocci,
disse que o ex-ministro deu consultoria para a JBS, auxiliando no
processo de aquisição da Pilgrim’s. “Foi entregue um relatório do
serviço prestado. Não há, portanto, qualquer irregularidade”, afirmou o
criminalista. A JBS informou, em nota enviada por sua assessoria de
imprensa, que não teve acesso ao inquérito. “A JBS contratou a Projeto
para a elaboração de estudos, análises e informações de cenários
macroeconômicos e do mercado mundial e norte-americano de proteína. O
contrato realizado com a Projeto, em 2009, e seus respectivos
pagamentos estão devidamente formalizados e documentados”, diz a
companhia. “Em nenhuma situação ou circunstância, Antonio Palocci
ajudou, se envolveu, ou teve qualquer relação entre os negócios da
companhia e o BNDES”, afirmou a JBS, ressaltando que o investimento do
banco estatal está “em linha com as melhores práticas de governança e
transparência, em uma transação típica de mercado”. O BNDES ainda não se
manifestou.
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