"Esse suposto pacto é absolutamente inverossímil. Não há o que temer."
Para o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Carlos Ayres Britto, as
insinuações do ministro do Planejamento (agora licenciado) Romero Jucá
(PMDB-RR) de que poderia incluir o STF em um esforço para barrar a
operação Lava Jato "não comprotem em nada" a independência da mais alta
corte do país e suas falas são "bravatas" ou "delírios de imaginação".
No diálogo ocorrido em março com o ex-presidente da Transpetro Sérgio
Machado e gravado de forma oculta, Jucá sugere que uma "mudança" no
governo resultaria em um pacto, que incluiria o STF, para interromper o
avanço da Lava Jato. No Supremo tramitam as apurações contra Machado e
Jucá, ambos investigados pela operação. As conversas foram divulgadas
nesta segunda-feira pelo jornal Folha de S. Paulo.
Em
entrevista coletiva nesta segunda-feira, Jucá negou que falasse de uma
interferência na Lava Jato, mas sim em estancar "a paralisia do Brasil,
estancar a sangria do desemprego, separar (os políticos) que têm culpa
dos que não têm culpa".
Em entrevista à BBC Brasil, Ayres Britto minimizou o impacto e a veracidade do que foi dito pelo então senador. Segundo a Folha,
ao citar a Corte, Jucá afirmou que havia "poucos caras ali (no STF)"
aos quais ele não tinha acesso. Um deles seria o ministro Teori
Zavascki, relator da operação no tribunal.
Para o ex-ministro, as
insinuações de Jucá foram feitas "por conta própria, num diálogo com um
amigo, companheiro de partido", mas não têm impacto na Lava Jato, "que
já se tornou, pela sua relevância, uma questão de honra nacional".
"Não
há por que a sociedade brasileira recear, não há o que temer quanto ao
amadurecimento das instituições brasileiras que não governam, mas
impedem o desgoverno, que é o caso desse trio institucional composto
pela Polícia Federal, pelo Ministério Público e pelo Judiciário", afirma
Ayres Britto. Questionado pela reportagem se seria ingenuidade de Jucá
sugerir isso, o ex-ministro respondeu: "Não diria ingenuidade. Está mais
para bravata ou delírio de imaginação".
'Ninguém é dono'
Ele
diz que as investigações ganharam autonomia e não seria possível
interferir no seu andamento. A isso se somaria o amadurecimento do
sistema de justiça brasileiro, que estaria comprovando sua independência
ao prosseguir com as apurações.
"Ninguém é dono da Lava Jato. Ela
ganhou estatura, dimensão própria. E as instâncias que compõem o
sistema de justiça, inclusive o Supremo, estão dando sobejas
demonstrações do mais absoluto prestígio ao desenvolver a operação."
Questionado
sobre as supostas relações próximas entre ministros e parlamentares,
Ayres Britto disse que as instituições são independentes técnica e
politicamente. E elogiou Teori Zavacski, descrito como "fechado" por
Jucá.
"O STF é um primor de competência técnica e independência
política. Basta lembrar a figura de Teori Zavascki, que é um paradigma
de magistrado competente, independente e ético. (...) Esses méritos são
do colegiado em sua integridade, em sua inteireza. O país tem motivos
para se orgulhar do seu Supremo Tribunal."
Governo Temer
O ex-presidente
do Supremo evitou fazer comentários sobre o conhecimento de Michel Temer
desse pacto nacional e afirmou que prefere acreditar no discurso de não
interferência do presidente interino. Em sua posse, Temer se
comprometeu a não intervir na Lava Jato.
"Até porque se trata de
um constitucionalista, de um professor de Direito, um escritor jurídico e
alguém que sabe que o sistema de justiça não pode jamais trair o
sistema jurídico."
Para Ayres Britto, o governo Temer não representa ameaça à operação ou a outras instituições democráticas.
"A democracia brasileira mais e mais avança no sentido do fortalecimento das instituições republicanas", opina.
O
ex-ministro afirma que, assim como o governo atual não teria como
prejudicar a operação, o de Dilma não seria responsável pelo seu avanço.
Segundo ele, o legado tanto da Lava Jato como do mensalão não é de
nenhuma autoridade em particular, mas da democracia.
"São frutos
naturais da democracia, que tem um fortíssimo caráter republicano e,
portanto, ético. Ninguém é padrinho, ninguém é diretamente responsável
no plano pessoal por essa nova fase de eficácia do direito penal."
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