Mariana Schreiber
Da BBC Brasil em Brasília
Menos de duas semanas depois
do afastamento da presidente Dilma Rousseff, o governo interino de
Michel Temer foi atingido por sua primeira bomba relacionada à operação
Lava Jato.
O jornal Folha de S. Paulo divulgou nesta segunda-feira trechos de conversas entre o ministro do Planejamento, Romero Jucá, e o ex-presidente da Transpetro, Sergio Machado, que sugerem o uso do impeachment como forma de trocar o comando do país para conter as investigações de corrupção.
O trecho mais grave das conversas
relevadas pelo jornal é o momento em que Jucá diz que "tem que mudar o
governo pra poder estancar essa sangria". Segundo a reportagem, a fala
se refere à Lava Jato, que investiga os dois interlocutores da conversa,
Jucá e Machado.
Jucá negou as acusações, dizendo que falava não
de uma interferência na Lava Jato, mas sim em estancar "a paralisia do
Brasil, estancar a sangria do desemprego, separar (os políticos) que têm
culpa dos que não têm culpa".
No entanto, a Folha de S. Paulo divulgou os áudios apontando que Jucá não falava sobre economia na conversa.
Além
disso, a conversa sugeriria a necessidade de realizar um "pacto",
inclusive com o Supremo Tribunal Federal, para delimitar o alcance da
operação. Sob pressão, Jucá anunciou no fim da tarde que se licenciará
do Ministério do Planejamento a partir desta terça para que o caso seja
esclarecido, e que retornará caso seja "reconvidado" por Temer.
Segundo a Folha,
os diálogos foram gravados de forma oculta, em março, portanto antes de
a abertura de processo de impeachment contra Dilma ter sido autorizada
pela Câmara, em 17 de abril, e confirmada pelo Senado, em 12 de maio. A
reportagem diz que os áudios estão em posse da Procuradoria-Geral da
República (PGR) - a assessoria da instituição informou que não
comentaria o assunto.
Entenda abaixo os trechos mais importantes
da conversa entre Jucá e Machado e quais seu significados e possíveis
consequências políticas.
Impeachment como pacto para conter Lava Jato
Em determinado trecho da conversa revelada pela Folha,
Jucá diz que "tem que mudar o governo pra poder estancar essa sangria",
em aparente referência à operação Lava Jato. Os trechos transcritos
pela reportagem indicam que essa fala foi dita quando ambos discutiam o
risco de novas delações premiadas que poderiam comprometer o PMDB.
Em
outro trecho, Jucá acrescenta que um eventual governo Michel Temer
deveria construir um pacto nacional "com o Supremo, com tudo". Machado
então responde: "aí parava tudo". "É. Delimitava onde está, pronto",
resume o ministro, a respeito das investigações.
Para Renato
Perissinoto, professor de ciência política da Universidade Federal do
Paraná (UFPR), a revelação desses diálogos pode aumentar a pressão para
que o STF julgue o mérito do processo de impeachment, ou seja, se
manifeste sobre se há fundamento jurídico para a cassação de Dilma. Até o
momento, a maioria dos ministros tem sinalizado que a Corte deve se
limitar a interferir para garantir a legalidade do rito do processo.
"Claro que isso torna esse governo, do ponto de vista da legitimidade, ainda mais fraco", afirma o professor.
Segundo
Rafael Cortez, analista político da Consultoria Tendências, a conversa
de Jucá e Machado certamente será usada pelos apoiadores do retorno de
Dilma como forma de questionar a legitimidade do impeachment. No
entanto, considera que "ainda não há evidência de que isso por si só vai
reverter o apoio (à cassação de Dilma)", já que o novo governo "gerou
toda uma expectativa nos grandes agentes econômicos e em parte relevante
da sociedade".
No último dia 12, 55 senadores votaram pela
abertura do processo de afastamento da presidente. Será preciso que 54
votem por sua condenação para que a petista seja definitivamente
cassada.
Para Cortez, o fato de a conversa de Jucá ter vindo à
tona "é um sinal de que a votação final do impeachment não está
garantida", ainda que ele opine que a absolvição da presidente ainda
seja o cenário menos provável.
E se conversa tivesse sido divulgada antes?
Na
avaliação dos dois cientistas políticos, se a divulgação dessas
conversas tivesse ocorrido antes das votações da Câmara e do Senado
sobre o impeachment de Dilma, poderia ter influenciado o destino da
petista.
"Se essas gravações tivessem saído antes do processo de
impeachment, o constrangimento de tirar uma presidente contra quem não
se tinha nenhuma acusação (de favorecimento pessoal por corrupção) para
colocar no lugar um governo com sete ministros citados na Lava Jato
seria ainda maior", opina Renato Perissinoto, da UFPR.
Para
Cortez, o impacto das gravações seria mais relevante se elas tivessem
sido reveladas antes, pois agora que Temer chegou ao poder "tem
mecanismos na mão", como nomeações de cargos, para limitar impacto das
gravações no meio político.
"Enquanto era uma coalizão fora do
governo (defendendo o impeachment) e o status quo era o governo Dilma,
certamente a gravação teria impacto mais relevante", disse.
PSDB
Em outro momento da conversa, Jucá e Machado falam sobre como políticos do PSDB podem ser atingidos pela Lava Jato.
No trecho mais comprometedor revelado pela Folha,
Machado diz que "o primeiro a ser comido vai ser o Aécio (Neves,
senador e presidente do PSDB)". Em seguida, as transcrições indicam que
teria havido um "esquema" para eleger Aécio presidente da Câmara dos
Deputados. O mineiro presidiu a Casa entre 2001 e 2002, no final do
governo Fernando Henrique Cardoso.
"(Sussurrando) O que que a
gente fez junto, Romero, naquela eleição, para eleger os deputados, para
ele ser presidente da Câmara?", pergunta Machado, segundo a Folha.
Pouco
depois, Machado continua: "O Aécio, rapaz... O Aécio não tem condição, a
gente sabe disso. Quem que não sabe? Quem não conhece o esquema do
Aécio? Eu, que participei de campanha do PSDB...".
Jucá apenas responde: "É, a gente viveu tudo".
Para Cortez, a referência a Aécio traz instabilidade para a aliança política que dá base ao governo Temer no Congresso.
"Isso
indica que a coalizão (pró-impeachment) não vai necessariamente se
traduzir numa ampla janela de (aprovação de) reformas (no Congresso). O
PSDB vai dar o apoio (ao governo Temer) mas ao mesmo tempo vai procurar
se descolar".
Já Perissinoto observa que esse é mais um episódio
que tende a enfraquecer Aécio, que já vinha enfrentando o desgaste de
ter sido citado em delações da Lava Jato, por exemplo como suposto
beneficiário de um esquema de corrupção em Furnas, estatal do setor
elétrico, o que o senador nega.
Jucá e Machado comentam que Aécio
não teria mais chances de vencer eleição, aparentemente em referência à
próxima disputa presidencial em 2018.
"Curiosamente, embora o PSDB
tenha sido uma das lideranças no processo de impeachment, esse processo
o enfraqueceu", diz Perissinoto, citando o fato de a Lava Jato ter
"transbordado para todos os partidos".
Cunha
Jucá
e Machado também conversam sobre a situação de Eduardo Cunha,
presidente afastado da Câmara dos Deputados sob acusação de usar seu
cargo para atrapalhar investigações.
Para o ministro do
Planejamento, o deputado "está morto". Em aparente referência a Cunha,
ela também indica a necessidade de que algum político seja punido para
diminuir a pressão popular.
"Tem que ser um boi de piranha, pegar
um cara, e a gente passar e resolver, chegar do outro lado da margem",
disse a Machado. Na entrevista coletiva desta segunda-feira, Jucá disse
que não se referia a um bode expiatório, mas sim em "punir os culpados"
pela corrupção.
Para Perissinoto, a estratégia de eventualmente
usar Cunha como bode expiatório não funcionaria. "Eu acho que é um erro
de cálculo, porque se tem um cara que não se deixa matar tranquilamente é
o Cunha. Porque ele tem não sei quantos deputados na mão dele, conhece o
podre de meio mundo. Se ele cai, vai cair um castelo de cartas com
ele".
STF e militares
Em
outro momento do diálogo, Jucá diz que teria conversado com ministros do
STF e militares sobre apoio ao processo de impeachment.
"(Em voz
baixa) Conversei ontem com alguns ministros do Supremo. Os caras dizem
'ó, só tem condições de (inaudível) sem ela (Dilma). Enquanto ela
estiver ali, a imprensa, os caras querem tirar ela, essa porra não vai
parar nunca'. Entendeu? Então... Estou conversando com os generais,
comandantes militares. Está tudo tranquilo, os caras dizem que vão
garantir. Estão monitorando o MST, não sei o quê, para não perturbar",
disse Jucá, segunda a transcrição da Folha.
Na avaliação de
Cortez, essas afirmações tendem a fazer com que o Supremo atue para
"reforçar esses sinais de que ele não está associado a partidos
políticos e que tampouco é partidário do movimento de minimizar os
efeitos da Lava Jato".
"É usual que lideranças políticas encontrem
canais de diálogos com ministros de Supremo. Evidentemente, a
insinuação de que esses contatos deveriam representar desvios aumentam o
incentivo do Supremo de reforçar os sinais de que ele de fato é
independente do processo político", observa.
Sobre jaguarverdade
Sou Casado, pai de 3 filhos, apaixonado pela minha família e pela minha querida cidade Jaguaruana... Jaguaruana Verdade, Porque Mentira tem Pernas Curtas!
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