Em depoimento por telefone a VEJA, Dani Cristina, de Cuiabá, conta o sofrimento de ter perdido Rhayron por envenenamento com um achocolatado

Rhayron, de apenas dois anos, morreu após consumir um achocolatado envenenado. (Arquivo pessoal/Divulgação)
O caso da morte do Rhayron, de dois anos, ocorrido em Cuiabá,
no 25 de agosto, comoveu o país. Rhayron morreu envenenado após consumir
um achocolatado em casa. A história ganhou proporções ainda mais
assustadoras, quando, uma semana depois, dois homens foram acusados de
envolvimento na adulteração da bebida. Um deles, Adônis José Negri, de 61 anos, confessou o crime.
No fim da tarde desta sexta-feira, oito dias após perder o filho, Dani
Cristina dos Santos falou a VEJA sobre a dramática história. A seguir,
trechos do emocionante depoimento.
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O momento do envenenamento
Foi tudo muito muito rápido. Foi assim: eu acordei, o Rhayron veio
atrás de mim, eu peguei o achocolatado na geladeira, abri, experimentei e
dei para ele. Tudo que vou dar para meus filhos eu experimento. Não
senti gosto azedo. Estava normal. Depois passei mal. Mas na hora não
senti nada. Aí o pai do Rhayron chamou ele e falou ‘vem aqui dar um
abraço no papai’ . Ele foi correndo abraçar. Na hora do abraço, o
Rhayron começou a sentir falta de ar e eu saí correndo pedindo ajuda
para os vizinhos.
O hospital
Foi tudo muito rápido. Passou um homem de carro e me levou na
Policlínica. Todo mundo se mobilizou para atender o meu filho. Todo
mundo tentou fazer o possível por ele. A única coisa é que ‘julgaram’ um
pouco a situação. Falaram que ele tinha bronco aspirado o leite, mas eu
falei ‘não’! . Mas eles falavam que tinha que me conformar. Eu falei
que não ia me conformar e disse que tinha alguma coisa errada. Ele não
tinha engasgado! Tentaram reanimar meu filho, mas não conseguiram. Ele
era uma criança que tinha acabado de completar dois aninhos. Tinha feito
aniversário há dois dias. Era perfeito, nunca tinha ficado doente. Nem
gripe tinha tido.
O sentimento de culpa do pai
Meu marido não quer falar. Ele está desnorteado, Revoltado. Não o
culpo. Foi a situação que nos levou a fazer isso. Ele vive de bicos, mas
no presente momento não estava fazendo nada. Mas ele se sente culpado.
Ele não quer falar comigo. Chega em casa e só abraça a Penélope. Tenho
medo de ele fazer alguma coisa. Eu vendia espetinho na rua, mas não
conseguimos fazer mais nada. Precisamos de ajuda. O que vier aceito de
bom coração.
A dor
Parece que arrancaram meu coração. Às vezes acho que vai melhorar,
mas piora cada vez mais. Parece que tiraram um pedaço de mim. É um vazio
que não sei explicar.
Grudado na mãe
Meu filho era mais grudado em mim do que no pai e do que em qualquer
outra pessoa. Ele estava sempre comigo. As pessoa diziam que ele era o
“meu rabo”. Onde eu estava, ele ia atrás. ‘Ave Maria’ , essa é a parte
mais dolorida. Tudo me lembra ele. Todos os lugares.
Penélope, a outra filha
Eu tenho uma menininha de 3 anos, apenas um ano mais velha que o
Rhayron. Graças a Deus, ela não estava em casa naquele dia. Estava com a
sua madrinha. Hoje, quando chegamos em casa ela fala assim: ‘ih, o Rhayron não chegou ainda, mãe. Vai lá no céu buscar o Rhayron, mãe. Tá demorando’.
Justiça
A única coisa que eu quero é justiça. Quem está levando a culpa da
morte do meu filho é esse senhor que eu nunca nem vi na minha vida. Eu
só sei que quero justiça. Quero que ele pague pelo que fez. Sei que
justiça tarda mas não falha. Graças a Deus prenderam ele. Não quero ele
solto na rua. Já sobre o Deuel, eu não posso julgar ele. Não posso
falar dele, porque eu acho que ele não teve a intenção. Eu acho, né?
Mas também… já não tenho certeza de mais nada. Depois que perdi meu
filho não consigo mais confiar em ninguém. Eu só quero ele de volta aqui
comigo.
Entenda o caso
Na quinta-feira da semana passada, Rhayron, de dois anos sofreu
parada cardiorrespiratória após tomar achocolatado Itambezinho. Segundo a
mãe, o filho bebeu o produto por volta das 9 horas da manhã e em
seguida começou a passar mal. Além da criança, ela e Alan José, um amigo
da família, também apresentaram mal-estar após ingerir a bebida.
Inclusive, Alan precisou ser submetido a uma lavagem estomacal e ficou
alguns dias hospitalizado. Rhayron chegou a ser levado para a Policlínica do Coxipó, em Cuiabá, Mato Grosso, mas faleceu uma hora após chegar ao local.
Na quinta-feira (01), o caso teve uma reviravolta quando a polícia
prendeu Adônis, que confessou ter envenenado o achocolatado, e Deuel
de Rezende Soares, de 27 anos, que furtou a bebida e vendeu para o pai
da criança por dez reais. Como a família está passando por dificuldades
financeiras, o pai comprou o produto por estar mais barato do que no
mercado.
O laudo da perícia confirmou que a morte do menino foi provocada pela
ingestão de um veneno de rato e a contaminação externa de todas as
unidades de achocolatado encontradas na casa da família. Embora,
Adônis tenha dito que “o veneno era para rato”, a polícia acredita que
ele fez isso para se vingar de seu vizinho Deuel, que frequentemente
furtava bebidas e alimentos de sua residência. Adônis foi autuado por
homicídio qualificado com emprego de veneno, além de tentativa de
homicídio já que Alan também quase morreu após ingerir a bebida. Deuel
vai responder por furto qualificado e ambos estão presos no Centro de
Ressocialização e Custódia de Cuiabá (CRC).
De acordo com o delegado da Delegacia Especializada de Defesa da
Criança e do Adolescente (Deddica) de Cuiabá (MT), Eduardo Botelho, na
próxima semana será concluída a análise dos materiais – bandeja
supostamente utilizada na manipulação do veneno, vestígio de
achocolatado dentro da geladeira e outras embalagens lacradas de
achocolatado – apreendidos na casa do Adônis e ainda serão ouvidas
outras testemunhas, como Alan José, amigo da família que também foi
envenenado, e pessoas do círculo familiar da Rhayron.
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