Sales, assim era conhecido um senhor alto, branco, de olhos
verdes. Casado com a senhora Júlia e pai do Júlio Sales e do Francisco. Seu
Sales, como assim era chamado por todos, foi pioneiro na área do comércio aqui
no município de Jaguaruana. Com seu jeito simples, mas muito verdadeiro, a
igualdade no atendimento era marca registrada. Por mais que fosse freguês ou
amigo, não adiantava, só atendia conforme a ordem de chegada, não importava que
fosse criança, jovens ou idosos, para ele, todos tinham direitos iguais.
Sempre sério e muito concentrado em suas anotações, conferir
as compras e somar uma por uma, duas ou até mais vezes era sempre uma forma de
não deixar dúvidas e a certeza de que ninguém sairia perdendo ou ganhando de
forma desonesta. Em sua bodega, a funcionária de confiança era sua esposa, dona
Júlia e de vez enquanto, nas manhãs dos Sábados, colocava, já para ir pegando
experiência, seu filho Júlio que sempre atento aos olhares do pai, atendia a
freguesia, revisava as compras feitas pelos fregueses e proferia o valor a ser
cobrado.
Francisco seu filho mais novo, logo escolheu a carreira de
músico ao ponto de pouco está junto com seu pai e sua mãe no comércio. Um jovem
inteligente, cheio de vida que muito novo foi pego de forma sutil e voraz por
uma doença que dizimou sua vida, causando a família um momento de muita
tristeza e dor. Recordo-me nos dias atuais daquele triste momento. Jaguaruana
parou ao saber que o jovem músico promissor, haveria sucumbido a uma doença,
até então desconhecida, e teria partido para outro Plano.
Depois de passar por essa tragédia, a família que antes eram
quatro se resumiria apenas em três membros. Mesmo assim a certeza de que não
podia parar fez com que os remanescentes se entrelaçassem pelo laço afetivo do
amor e juntos tocassem o barco pra frente. A bodega continuava atendendo a
parte da população de Jaguaruana, pois a vida continuava. A rotina de senhor
Sales era todos os dias, ao acordar, abrir as portas de seu comércio para
atender aos seus fregueses.
Quem não recorda da quarta de açúcar, do pacote de bolacha,
do tijolinho de leite e, principalmente da quarta de café, torrado na hora? Fui
um agraciado por tudo isso que falei. Meu avô, seu Lourenço e meu pai, seu
Manuel do Quebra Queixo foram fregueses do Sales por muitos anos. Quando decidi
fazer essa simples homenagem à história de Jaguaruana, fiz com a propriedade de
que presenciei grande parte do que aqui estou escrevendo.
Vivi minha infância tendo que me deslocar do Bairro Alto
para a bodega do Sales todos os dias, não só uma ou duas vezes e sim sempre que
fosse necessário. Confesso que seu jeito sério de atender aos fregueses me
causava, de certa forma, pânico, mas nunca fui destratado pelo mesmo. Quando
criança ou adolescente, ir até a bodega do Sales fazer compra, fosse para o meu
pai ou meus avós, era a certeza de que no caminho iria se deliciar com uma
saborosa merenda, mesmo sabendo que correria o risco de ser descoberto, pois o
mesmo sempre perguntava: SEU PAI OU SEU AVÔ SABE DISSO? Nunca me esqueci dessa
pergunta.
Hoje Jaguaruana não tem mais a presença dessa família que
fez e continuará fazendo parte da nossa história. Todos já são falecidos,
primeiramente Deus levou o Francisco, filho mais novo do casal. Depois foi o
mestre da Família, o senhor Sales, o homem que todas as manhãs comia uma banda
de melancia na calçada do seu comércio. Em seguida, dona Júlia foi à escolhida
para fazer parte da família no reino do Céu e por último o Júlio Sales, aquele
ao qual tive o prazer de conviver um pouco mais, pois eu e ele éramos quase da
mesma idade.
Decidi escrever esse artigo para que Jaguaruana não se
esqueça da importância dos filhos de outras cidades que adotam nosso município
como Terra mãe. Pra quem não sabe o senhor Sales é de família da vizinha
Itaiçaba. Veio para cá e aqui se adaptou e construiu sua história, nada mais
justa que não seja esquecida. Dizem os mais velhos que ele foi, o primeiro
ganhador da Loteria em nossa região e que na época fez 13 pontos e que depois
desse dinheiro que ganhou, montou seu comércio. Verdade ou não, o certo é que
até hoje, grande parte do povo de Jaguaruana se lembra do seu jeito simples de
ser.
Esse foi um pequeno resumo de quem foi o Senhor Sales, um
cidadão que não divulgo seu nome completo porque não sei, mas que, apesar do
seu pouco tempo de vida em nosso meio, escreveu sua história no livro daqueles
que amam Jaguaruana. Finalizo esse artigo, deixando aqui para aqueles que o
conheceram, as imagens do seu comércio. Mesmo sabendo que em breve a história
não poderá ser contada, jamais. Sinto-me no prazer de dizer de peito e alma
limpa: EU FIZ PARTE DESSA HISTÓRIA!

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