Genebra – O Ministério Público da Suíça aponta que o envolvimento da Odebrecht
em esquemas de corrupção era altamente lucrativo para a empresa.
Segundo as investigações do país europeu, para cada US$ 1 milhão pago em
propinas a políticos, funcionários públicos brasileiros e de estatais, a
empresa lucrava US$ 4 milhões com contratos que lhe eram dados por
aqueles que recebiam os pagamentos.
A mesma investigação aponta
que as contas secretas mantidas pela Odebrecht na Suíça financiaram de
forma “regular” campanhas políticas, partidos ou políticos no Brasil,
inclusive ministros. As revelações fazem parte dos documentos do
Ministério Público suíço que foram usados como base para multar a
empresa brasileira.
De acordo com as investigações, pelo menos
66,5 milhões de francos suíços (cerca de R$ 210 milhões) foram pagos em
propinas a ex-diretores de estatais e outros funcionários públicos no
Brasil em propinas a partir das contas no país alpino.
Na semana
passada, a Suíça anunciou uma multa de US$ 200 milhões contra a
Odebrecht, como parte do amplo esquema de acordos de leniência fechados
pela construtora no Brasil e ainda nos EUA.
Nesta terça-feira, 27,
o Ministério Público publicou os documentos datados do dia 21 de
dezembro e que foram usados para justificar a multa e o confisco de
recursos, explicando em detalhes como a Odebrecht fazia para pagar
propinas.
Lucros
Segundo o MP suíço, as
investigações mostram que pagar propinas garantia lucros para a empresa.
Como resultado do sistema criado, os investigadores suíços estimam que a
Odebrecht “lucrou pelo menos 4 milhões de euros com uma taxa de propina
de 1 milhão de euros”.
Por esse cálculo, os suíços estimam que
aproximadamente US$ 100 milhões seriam alvos de uma compensação que a
empresa teria de pagar. Mas ressalvam que, como o processo continua,
crimes de lavagem de dinheiro podem elevar ainda mais os valores
confiscados pelo Ministério Público. O que determinará esse eventual
novo confisco estaria ligado à proporção estabelecida de 4 x 1 entre os
lucros obtidos pela empresa e o pagamento de propinas.
Se a
Odebrecht ficou com os lucros, quem perdeu foi o Estado brasileiro e a
população. “Os interesses fiscais públicos do Estado brasileiro foram
afetados: a comunidade pagou um preço inflacionado pela realização dos
projetos dados para a Odebrecht e também financiou a propina”, afirmou o
MP suíço.
Pagamentos
Os nomes dos
beneficiários, porém, foram mantidos em sigilo, já que as investigações
continuam. Mas o Ministério Público confirma que foram feitos
“pagamentos em contas suíças para o financiamento de campanhas políticas
no Brasil e em outros lugares”.
Por meio de um departamento da
empreiteira dedicado ao pagamento de propinas, as transferências para
“funcionários públicos e políticos foram de centenas de milhões”.
Sem
citar nomes, os documentos suíços também revelam como os investigadores
chegaram à constatação de que os pagamentos estavam relacionados com
marqueteiros de partidos. Transferências, segundo eles, foram feitas
para pessoas que “fizeram seus nomes com a organização de campanhas
políticas”. Na Suíça, contas de João Santana – marqueteiro das campanhas
presidenciais de Lula (2006) e Dilma (2010 e 2014) – estão bloqueadas.
Para
os suíços, a direção da Odebrecht tinha “conhecimento do
estabelecimento e alocação de fundos de caixa 2, a camuflagem dos fluxos
de dinheiro por meio de transações transnacionais desses recursos
dentro desse caixa 2, assim como seu objetivo”.
Para o
procurador-geral suíço, “isso consiste em direcionar propinas e outros
pagamentos ilegais para funcionários públicos no Brasil, Panamá e
provavelmente em outros países”.
Com os bancos suíços, a Odebrecht
criou um sistema de caixa 2 para obter contratos. No total, a Suíça
investigou mais de 300 transações bancárias, com o envolvimento de
intermediários, funcionários públicos e outros suspeitos. A constatação
foi de que um total de aproximadamente 440 milhões de francos suíços
(cerca de R$ 1,4 bilhão) das subsidiárias da Odebrecht passaram pelos
bancos suíços entre 21 de dezembro de 2005 e junho de 2014. No total, o
sistema criado pela Odebrecht em todo o mundo movimento de forma ilegal
US$ 635 milhões.
Beneficiários
“Pagamentos
de propinas eram direcionados em grande parte para tomadores de
decisões nos governos, envolvendo contratos de licitação e contribuições
para partidos políticos e políticos”, explicou o MP. Com base nessas
informações, o MP concluiu que os pagamentos envolveram envio de
recursos a funcionários públicos estrangeiros usando contas na Suíça,
além de políticos, doleiros e campanhas políticas no Brasil e em outros
países.
Ao Brasil, tabelas confiscadas pelos procuradores apontam
que um total de pelo menos 66,5 milhões de francos suíços (US$ 210
milhões) foram pagos.
Entre os beneficiários de recursos da
Odebrecht estão ex-diretores da Petrobrás que, entre março de 2008 e
abril de 2014, obtiveram 43,7 milhões de francos suíços (R$ 138 milhões)
em contas secretas. Um outro pagamento de 8,7 milhões de francos suíços
(R$ 27,5 milhões) foi registrado em nome de outra pessoa não
identificada, além de 14,2 milhões de francos suíços (R$ 44,8
milhões)entre 2009 e 2012 a funcionários públicos que teriam um papel na
aprovação de projetos.
Os suíços também revelam que fica “claro a
partir das planilhas confiscadas” e pelas delações que existiam acordos
com políticos e tomadores de decisões dentro de instituições do
governo” para o pagamento de propinas. Além disso, houve um “acordo
regular para alocar certa parte desses recursos para certos políticos ou
partidos políticos”. “Esses pagamentos eram feitos a partir do Caixa
2”.
Prisão
Um dos pontos centrais na
investigação no país europeu foi a prisão de Fernando Miggliaccio, em 17
de fevereiro de 2016, em Genebra. Ele é descrito pelos documentos
suíços como um “responsável pelo departamento de “Operações
Estruturadas”, o setor na empresa responsável pelo pagamento de
propinas. “Muitos celulares, computadores e dados que estavam com esse
funcionário” foram confiscados.
De acordo com os suíços, a empresa
“sistematicamente impunha propinas em um sistema de caixa 2 para
influenciar na obtenção de contratos de infraestrutura”. Em agosto, ele
decidiu cooperar.
Segundo o MP, o sistema usado para retirar das
contas oficiais o dinheiro usado para o pagamento de propinas era
altamente estruturado. Os recursos precisavam ser “aprovados” pelos
principais responsáveis da empresa.
Na programação ainda estavam
os detalhes das obras, o superintendente responsável, o valor do
contrato e a propina paga. “Muitos dos planos e/ou instruções
(“programações”) eram feitas por semana (PROGRAMAÇÃO SEMANAL) ou por
trimestre (PROGRAMAÇÃO TRIMESTRAL)”, indicaram os documentos
confiscados. “Eles provam que esses fundos do caixa 2 eram em grande
parte intencionados a obter contratos”, apontou.
Servidor
Central
também na investigação suíça foi a descoberta de servidores mantidos
pela Odebrecht na Suíça, com “uma enorme quantidade de dados” dos
pagamentos de propinas. Em novembro, o jornal O Estado de S. Paulo
revelou que o país europeu havia confiscado o servidor. Agora, o
processo revela que, nele, dados equivalentes a 2 milhões de páginas de
documentos puderam ser retirados, “incluindo emails, ordens de
pagamentos, conferências e contratos que serviriam para justificar
pagamentos”.
“Além disso, milhares de listas foram confiscadas e a
partir dos pagamentos relatados por meio do sistema ilegal foram
listados, com datas de pagamento, o valor e o nome dos recipientes”,
indicou o MP suíço.
Miggliaccio teria tentado apagar os dados do
servidor em fevereiro e, de fato, sua operação teria ocorrido com
sucesso. Mas acabou sendo preso.
Em um comunicado de imprensa
emitido na semana passada, a Justiça suíça indica que, apesar da multa
aplicada, vai continuar a investigar o caso da Odebrecht. A reportagem
apurou que o centro do inquérito, agora, é o destino dos recursos.
Defesa
“A
Odebrecht não se manifesta sobre o tema, mas reafirma seu compromisso
de colaborar com a Justiça. A empresa está implantando as melhores
práticas de compliance, baseadas na ética, transparência e integridade.”
0 comentários:
Postar um comentário