Pesquisa mapeou os hábitos de sono de um total de 8.000 pessoas em 20 países
Depois que Eduardo dorme, Lívia ainda faz trabalho doméstico antes de se deitar
O descanso restaurador que só o sono é capaz de
produzir tem sido cada vez mais sacrificado pelos brasileiros. Motivados
por obrigações sociais e pressionados a dar conta de todas as tarefas
diárias, eles estão indo para a cama cada vez mais tarde e dormindo cada
vez menos.
A enfermeira Lívia Dutra, 32, por exemplo, conta que
só consegue descansar depois que o filho Edu, 2, dorme. E isso
geralmente acontece após às duas da madrugada. Como durante o dia não dá
para fazer tudo, Lívia conta que já trocou as horas de sono para
arrumar a casa, fazer as unhas e adiantar o almoço do dia seguinte. Com
isso, Lívia acaba dormindo cerca de seis horas. “Acho que 24 horas é
muito pouco!”, afirma.
Esse padrão de sono cada vez mais
espremido entre os afazeres foi identificado por pesquisadores do
Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e da Universidade de
Michigan, nos Estados Unidos.
Eles coletaram dados de usuários de
20 países por meio de aplicativos de celulares e descobriram que, ao
lado de países como Singapura e Japão, os brasileiros estão entre os
povos que menos ficam na cama – em média, sete horas e 34 minutos –,
diferentemente de holandeses e franceses, que dormem mais de oito horas
por dia. Em Singapura o sono não dura mais do que sete horas e 24
minutos, e os japoneses permanecem sete horas e 31 minutos deitados.
O trabalho, publicado na revista científica “Science Advances”,
recolheu ao todo dados sobre o sono de 8.000 pessoas. Essa amostra
permitiu que os pesquisadores destrinchassem o material para entender
como gênero, idade e fatores culturais influenciam esse comportamento.
Perceberam, por exemplo, que, em geral, os usuários mais velhos dormem
menos do que os mais novos, e as mulheres dormem, em média, 30 minutos a
mais do que os homens cada noite.
Para o empresário e engenheiro
Joaquim Gaspar, 40, seis horas e meia por noite são suficientes.
“Sempre corri da cama. Geralmente durmo por volta de 0h30 e acordo às
7h, mas não pretendo mudar, pois quando durmo mais me sinto mal, fico
meio zonzo, enjoado, não gosto”, afirma.
Outra conclusão do
estudo foi a de que as pessoas que passam algum tempo sob o sol por dia
tendem a ir para a cama mais cedo e a dormir mais do que aquelas que
passam a maior parte do seu tempo na luz artificial. E essa exposição é
muito importante para o organismo, uma vez que o sono é conduzido por um
relógio interno que codifica a nossa exposição à luz diária para
regular várias funções do corpo.
O desequilíbrio está
acontecendo, segundo os pesquisadores, porque os fatores culturais
determinam a hora em que dormimos – quão tarde ou quão cedo vamos para a
cama. Mas interferem pouco no horário de despertar, ainda fortemente
influenciado pelo relógio biológico. E, no fim, é o horário em que você
vai para cama que dita se você vai dormir muito ou pouco.
De
acordo como professor de bioinformática e um dos autores do estudo,
Daniel Forger, cada meia hora de sono faz uma grande diferença em termos
de função cognitiva e saúde em longo prazo. “Um em cada três adultos
não está cumprindo o mínimo recomendado de sete horas. A privação do
sono aumenta o risco de obesidade, diabetes, pressão arterial alta,
doença cardíaca, acidente vascular cerebral e estresse”, diz.
Números
7h34 é a média de horas de sono do brasileiro.
30 min a mais, em média, as mulheres passam na cama.
7h é o mínimo de horas de sono.
Aplicativo teve acesso aos padrões de sono mundiais
A aplicativo usado na pesquisa é o Entrain, lançado em 2014 para ajudar
o usuário a se recuperar do jet lag, pois quem viaja para locais com
fusos horários diferentes leva um tempo para se acostumar. Contudo, ele
acabou tendo acesso aos horários de sono de pessoas em todo o mundo, o
que permitiu o estudo inédito, até então só feito em laboratórios, com
voluntários monitorados por câmeras e eletrodos. Para deixar a vida de
“vampira”, como o próprio marido de Lívia brinca, ela aposta na
escolinha que o filho irá frequentar no próximo ano. “O corpo pede para
dormir, fico irritada, nervosa, mas com a escolinha vou conseguir me
organizar, vou ter horário, rotina”, espera a mãe. (LM)
Litza Mattos
0 comentários:
Postar um comentário